sexta-feira, 29 de junho de 2018

ENFRENTAMENTO À HOMOFOBIA E RECONHECIMENTO DE DIREITOS: LUTA PELA CIDADANIA HOMOSSEXUAL

Não existe cura para o que não é doença.


A ideia de homofobia está para além da aversão e medo de homossexuais, representa a acepção de que as sexualidades podem ser hierarquizadas, sendo a heterossexualidade, supostamente superior à homossexualidade. Neste sentido, direitos e proteção são negados aos homossexuais, colocando-os como sujeitos detentores de uma “cidadania relativizada”. Faz-se necessário garantir o reconhecimento da cidadania homossexual como forma de superar a homofobia existente em nossa sociedade e garantir as finalidades do Estado Democrático de Direito e o ideal de Justiça Social. No início dos anos 80, assistimos, no Brasil, a um fortalecimento da luta pelos direitos humanos de Gays, Lésbicas, Travestis, Transgêneros e Bissexuais (LGBT)1. Milhares de ONG‟s (Organizações não Governamentais) espalhadas pelo Brasil têm como finalidade a Luta pela efetivação da cidadania de homossexuais e a garantia de Direitos Humanos para esta população. Desde então, importantes conquistas vêm sendo alcançadas pela população LGBT, no sentido de garantir a visibilidade e reconhecimento de homossexuais perante o Estado. Estas conquistas vão desde o reconhecimento judicial das uniões homoafetivas até projetos de lei que visam criminalizar a homofobia. Os homossexuais vêm enfrentando a histórica situação de discriminação e marginalização que os coloca a margem da sociedade brasileira. Os que, mesmo diante de um contexto cultural adverso, conseguem “sair do armário”, assumir sua orientação homossexual, e se reconhecerem como sujeitos de direitos, cumprem um papel fundamental na visibilidade e reconhecimento de Direitos Humanos elementares. Essa visibilidade vai desde o empoderamento social para se afirmar como cidadão, um exemplo é a participação nas “Paradas pelas Diversidades Sexuais”, até o engajamento em graves problemas de interesse público, sendo casos exemplares as mobilizações em torno da luta contra o HIV/AIDS e o combate à homofobia. Não  há  dúvidas quanto  ao  fato  dessa  luta  pela  cidadania  estar  produzindo relevantes conquistas. A Associação Americana de Psiquiatria retirou o “homossexualismo” 2do rol de doenças do rol de doenças mentais em 1973. Seguindo esse posicionamento, o Conselho Federal de Medicina brasileiro fez o mesmo em 1985. Em 17 de maio de 1990, a Organização  Mundial  da  Saúde  (OMS)  retirou  a  homossexualidade  da  lista  de  doenças mentais do Código Internacional de Doenças. O Conselho Federal de Psicologia, por sua vez, determinou,  em  1999,  que  nenhum  profissional  pode  exercer  “ação  que  favoreça  a patologização de comportamento ou práticas homoeróticas”3. 

 _____________________________________________________________
1  Atualmente, o termo oficial usado para a diversidade no Brasil é LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e trangêneros). Esta alteração terminológica de GLBT para LGBT foi aprovada na 1ª Conferência Nacional GLBT realizada em Brasília no período de 5 e 8 de junho de 2008. A mudança da terminologia foi realizada a fim de valorizar o movimento lésbico no contexto da diversidade sexual e também de aproximar o termo brasileiro com o termo predominante em várias outras culturas e Estados. 2 O termo homossexualismo passa a se diferenciar do termo homossexualidade. O sufixo “ismo” é utilizado para terminologia de palavras associadas às doenças, já o sufixo “dade” significar ser. Com a retirada do termo


Em que pese a Constituição Federal de 1988 não contemplar de forma expressa a orientação sexual entre as formas de discriminação, diferentes constituições estaduais e legislações municipais vêm identificando explicitamente esse tipo de discriminação. No entanto, com a nova hermenêutica constitucional e a partir de uma interpretação extensiva no sentido de se efetivar os Direitos Humanos Fundamentais, visualizamos um protagonismo judicial no sentido de reconhecer direitos básicos para os homossexuais. Discute-se, portanto, na construção de um compêndio legislativo e jurisprudencial que objetiva o reconhecimento dos “Direitos à livre orientação sexual”. Reconhecimento de benefícios previdenciários pelo Instituto Nacional de Seguridade Social – INSS, e o reconhecimento de “novos” arranjos familiares – casos de guarda, adoção e, até mesmo, casamento – são exemplos do importante papel que o Poder Judiciário vem exercendo. Apesar das inúmeras conquistas na defesa dos direitos dos homossexuais brasileiros, o preconceito e a discriminação resultam de uma construção cultural e moral da nossa sociedade. Portanto, é evidente que “tempos mudaram”, pode-se falar que, atualmente, homossexuais são “tolerados” por parte da população. 

Entretanto, vivenciam-se cotidianamente inúmeras manifestações  de preconceito e discriminação. Diversas são as formas de violência  que    são    dirigidas    aos homossexuais, desde agressões verbais até mesmo os crimes cometidos pelo ódio e não aceitação do homossexual. Neste contexto é que encontramos a ideia de homofobia. O termo homofobia4  foi utilizado pela primeira vez, em 1971, em um artigo de K. T. Smith, sendo 
 “homofobia o medo irracional, repulsa e desprezo manifestado por certas pessoas face às relações afetivas e sexuais entre pessoas do mesmo sexo. É um ódio generalizado contra os homossexuais e a homossexualidade, reflexo do preconceito heterossexista, do patriarcalismo e do machismo” (MOTT, 2003, p.1). 

_________________________________________________________________________ 

homossexualismo da lista de Classificação Internacional de Doenças (a CID), o termo homossexualidade é o melhor empregado para designar a existência homossexual como mais uma expressão da sexualidade. 3 Recentemente, acompanhamos o debate nacional sobre um projeto de lei, proposto pela bancada evangélica da Câmara dos Deputados, que tinha por objetivo estabelecer a “Cura Gay” (Néri, 2014). 4  Aqui “homo”deriva de “homós”, do grego, que significa “semelhante”, “igual”; a distinguir de seu homônimo “homo”, nominativo latino de “homo”, “homonis”, ou seja “o homem”. Portanto, nos esquivaremos de utilizar neste trabalho termos como: “lesbofobia” e “transfobia”

Para tanto, este ódio aos homossexuais não pode se reduzir ao aspecto da “irracionalidade”, pois é “uma manifestação arbitrária que consiste em designar o outro como contrário, inferior ou anormal; por sua diferença irredutível, ele é posicionado a distância, fora do universo comum dos humanos” (BORRILLO, 2010, p. 13). Assim, a homofobia desempenha um importante papel na construção do preconceito, discriminação e violência contra homossexuais, na medida em que hierarquiza as sexualidades, colocando a heterossexualidade em um status superior a homossexualidade. 

A ideia de uma sexualidade hierarquizada, onde a homossexualidade seria um tipo de sexualidade inferior, provoca a conversão da diferença e desigualdade. Dessa forma, direitos e garantias fundamentais são negados aos homossexuais. A desconstrução dessa desigualdade deve-se dar no campo sócio-jurídico, com o reconhecimento de direitos homossexuais. 

Na  tentativa  de  superar uma  desigualdade  histórica vivenciada  por homossexuais, imperioso é pesquisar sobre as origens da Homofobia, seu surgimento e as doutrinas que fundamenta o ódio e a aversão aos homossexuais. Compreender quais são os direitos fundamentais que são negados aos homossexuais, como devemos interpretar a constituição para fins de efetivar direitos homossexuais. Analisar a legitimidade e bandeiras de luta do Movimento LGBT a luz das chamadas “teoria do reconhecimento” e “teoria da justiça”. Além de analisar como o Estado brasileiro vem reconhecendo os Direitos dos homossexuais. 

FONTE: Revista de Direitos Humanos e Efetividade | e-ISSN: 2526-0022 | Minas Gerais | v. 1 | n. 2 | p. 98 - 118 | Jul/Dez. 2015. 100 

Nenhum comentário:

Postar um comentário