sexta-feira, 27 de agosto de 2021

O ESTOICISMO




O Estoicismo é  uma escola filosófica de origem grega, fundada por volta do ano 300 a.C., por Zenão de Cício. O Estoicismo vê a filosofia constituída de três partes interligadas: a física, a lógica e a ética. É a sua ética, porém,  que mais influenciará o pensamento ocidental e o Cristianismo  dos primeiros séculos e até hoje muitos de seus fundamentos estão presentes na filosofia contemporânea.

A idéia de uma razão divina a governar o mundo, a visão do homem como um ser racional e cidadão do mundo além da condenação da exaltação das emoções são alguns dos princípios estóicos. Defendiam ainda a igualdade entre os homens e criam que são as paixões as produtoras de males como ambição,  vaidade, crueldade, por exemplo.

O que mais se destacou no campo ético da filosofia estóica foi o ideal de ATARAXIA, a imperturbabilidade, a ser perseguida pelo homem que busca ser sábio. Ser sábio, nessa direção, é ser feliz e, para ser sábio, o homem precisa se harmonizar com a natureza, suportando os sofrimentos da existência, dominando suas paixões até alcançar a vida contemplativa onde não mais sofrerá diante dos acontecimentos naturais na ordem das coisas, atingindo a serenidade.

SÊNECA E A CONSTÂNCIA DO SÁBIO

Sigamos com a reflexão em torno do texto de Sêneca, A CONSTÂNCIA DO SÁBIO, buscando suas contribuições  sobre a arte de enfrentar problemas nos relacionamentos humanos, especialmente as injúrias ou ofensas graves e as contumélias, ou insultos leves.

Comecemos pela lúcida assertiva abaixo:

            “Não há nada, na Natureza, de tão sacro que não seja atingido por algum desrespeito”. (Sêneca: 2007, p. 25)

Sêneca nos afirma, em seu distante tempo histórico, que nem as coisas divinas estão fora do desejo de alguém intentar contra sua magnitude, fato ainda e tão mais presente nos dias de hoje, quer através da negação de Deus, do sectarismo  religioso e até de posturas belicosas e destrutivas, em nome do sagrado.

O homem que busca ser virtuoso, claro, deve estar consciente de que está infinitamente mais exposto aos ataques daqueles que querem alvejá-lo, apenas porque movimenta-se para a luz, só  por isso.

Para esse enfrentamento, Sêneca identifica como importante a atitude de reação perante injúrias e insultos como um exercício de paciência, ânimo e capacidade de armazenar energia para prosseguir e não se deixar abater.

No capítulo II, o autor busca distinguir entre injúria ou ofensa e a simples contumélia, ou seja, o insulto provocativo de pouca monta ou importância.

A injúria, esclarece, é mais grave do que o insulto, pois busca intencionalmente fazer o mal a alguém, diminuir esse alguém. Se esse alguém já se tornou sábio, no entanto, olhará o fato sem se alterar, convicto de que nada interior perde pois, se já tem a virtude, essa injúria não lhe atingirá em sua intimidade e profundidade. Ilustrando a ideia exposta Sêneca lembra o exemplo do filósofo Estilpão ao responder a Demétrio, conquistador de sua cidade, Megara,  se havia sido espoliado de alguma coisa, ao dizer: “NADA PERDI. TUDO O QUE É MEU ESTÁ COMIGO”. Sábia resposta para quem tinha sido espoliado nas coisas materiais, mas que conservava, incólume, suas conquistas, seu verdadeiro tesouro: idéias, valores, virtudes.

Sêneca apresenta a afirmativa síntese de Estilpão, nos termos seguintes: “EU, DE MINHA PARTE, APESAR DE TUDO TER PERDIDO,  MANTENHO-ME NA POSSE PLENA DO QUE ME PERTENCE.”

Continuando a apresentar seus argumentos a partir do exemplo de Estilpão, o autor considera que a injúria pode acontecer sempre, pois é fruto da ação deliberada de alguém, mas não significa que tenha ressonância junto àquele que é sábio, capaz de suportar golpes tais como: “acusador contratado, pedras caluniosas, poderosos irritados e roubalheiras…”(idem, p. 43).

Somos humanos e, por essa razão, Sêneca entende que ninguém recebe uma injúria sem alguma perturbação, ainda que rápida, mas se esse alguém já é um sábio, mantém-se firme, bem disposto e bem-humorado, paciente e com grandeza de alma.

A partir do capítulo VII, o filósofo estóico analisará a contumélia, ou insulto, uma ofensa menor, mais queixume do que maldade ou vingança.

Os melindres e os desejos de destaques não atendidos, quando interiorizados, tornam algumas pessoas alteradas emocionalmente e que passam a se apresentar como indivíduos soberbos e insolentes.

CONTUMÉLIA é palavra derivada do vocábulo “desprezo”, diz o autor em destaque. Os indivíduos que agem movidos por essa emoção são denominados de “adultos criançolas”, o que hoje chamaríamos de indivíduos imaturos, que mesmo se encontrando  na fase adulta fisiológica, mantêm fortes  traços comportamentais infantilizados.

O sábio reage a esses como quem enfrenta crianças que brincam de modo desagradável, exigindo corrigenda. A reação do sábio é como a do médico diante do paciente que manifesta sua fraqueza e criancice. O médico é seguro e o sábio reage com segurança às contumélias diversas, às grosserias, tentativas de corrupção e até bofetadas, por identificar a infantilização de seus autores.

Nos capítulos seguintes, Sêneca comenta a fragilidade do enlouquecido Imperador Calígula ao enfrentar e fomentar as contumélias e destaca as reações sábias dos gregos Sócrates e Antístenes.

Finalmente, com grande sabedoria, o filósofo estóico recomenda que não nos fixemos nessas pequeninas coisas sob pena de comprometermos nossa tarefa de realizar as coisas necessárias à aquisição da sabedoria, pois não há quem não esteja apto a desferir a contumélia, já que ela está ao alcance de todos.

De modo brilhante, conclui que há o aspirante a sábio e o verdadeiro sábio diante das injúrias e insultos. O primeiro é o homem, o segundo é o sábio. O primeiro luta, o segundo já desfruta da vitória.

O recado final de Sêneca fica para meditação de todos nós:

            “CUIDA ENTÃO DE DEFENDER O LUGAR QUE A NATUREZA TE OUTORGOU.”
Que lugar é esse? A sabedoria.


http://www.mundoespirita.com.br/?materia=a-constancia-do-sabio

Bibliografia:

JAPIASSÚ, H.  & MARCONDES, D. Dicionário Básico de Filosofia. 3ª ed. RJ: Jorge Zahar ed., 1996.

SÊNECA. A Constância do Sábio. SP: ed. Escala , 2007.

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[1] Contumélias : Expressão usada por Sêneca para indicar os insultos leves, menos graves do que as injúrias