terça-feira, 28 de junho de 2016

CIBERCULTURA


Ciberespaço, cibercultura e educação.









Pierre Lévy

Pierre Lévy nasceu na Tunísia, país do norte da África, em 2 de julho de 1956, no seio de uma família de judeus; nesta época sua terra natal era colônia da França. Não se sabe praticamente nada sobre sua existência até 1980, quando ele terminou seu Mestrado em História da Ciência, na Universidade de Sorbonne, em Paris, a não ser que se graduou em História.

Sua vocação para a pesquisa lhe foi revelada durante um curso com o filósofo francês Michel Serres, na Sorbonne. Três anos após a conclusão de seu mestrado, Pierre defendeu sua tese em Sociologia eCiências da Informação e da Comunicação, igualmente na capital francesa, discorrendo sobre a idéia da liberdade na Antiguidade.

As pesquisas de Lévy se concentraram especialmente na área da cibernética e da inteligência artificial. Nos anos 80 ele passou a lecionar na Universidade de Quebec, em Montreal, no Canadá. Suas aulas giravam em torno da função dos computadores no mecanismo da comunicação.

Nesta mesma instituição ele cuidou da gestão do departamento de comunicação do campus, de 1987 a 1989. Ao retornar à França, o filósofo da informação, que se especializou em investigar as relações entre a Internet e a esfera social, ocupou o cargo de professor de Ciências Educacionais na Universidade de Paris-Nanterre, aí permanecendo de 1990 a 1992.

Em seus estudos ele aborda o papel fundamental das tecnologias na esfera da comunicação e a performance dos sistemas de signos na evolução da cultura em geral. Simultaneamente ao seu trabalho na educação, ele institui em Genebra, na Suíça, um instituto conhecido como Laboratório Neurope, onde atua como pesquisador.

O estudioso lança, em 1987, seu primeiro livro, A Máquina Universo - criação, cognição e cultura informática. Mas Pierre se torna particularmente famoso em todo o Planeta a partir de 1994, quando ele difunde sua tese sobre a ‘árvore de conhecimento’, um mecanismo que criou junto com Michel Authier. Este sistema é composto por um software de cartografia e pelo intercâmbio de conhecimentos entre comunidades, gerando uma ampla enciclopédia virtual em constante transformação.

Esta teoria é exposta na obra A Árvore do Conhecimento, lançada em 1992, fruto do trabalho dos dois pesquisadores. Anteriormente, porém, ele publicou seu livro mais popular no Brasil, As tecnologias da inteligência: o futuro do pensamento na era da informática, de 1990. Uma boa parte de sua bibliografia já foi publicada no Brasil.

A partir de 1993, Pierre passa a atuar como professor no Departamento de Hipermídia da Universidade de Paris-8, em St-Denis. De 2002 em diante ele assume como titular da cadeira de pesquisa em inteligência coletiva, na Universidade de Ottawa, novamente no Canadá. O filósofo logo se torna integrante da Sociedade Real do Canadá (Academia Canadense de Ciências e Humanidades).

Lévy já veio ao Brasil diversas vezes, proferindo palestras para uma média de 500 pessoas no Sesc Vila Mariana. Seus temas por excelência são a exclusão do universo digital, a Internet, as novas tecnologias da comunicação, o futuro da humanidade na esfera da contínua digitalização.


Fontes:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Pierre_Lévy
http://canaldaimprensa.com.br/canalant/perfil/dquartedicao/identidade1.htm
http://caosmose.net/pierrelevy/bio.html
http://www.corposem.org/rizoma/arvores.htm

CIBERESPAÇO: A Cibercultura na Educação


                                                               

por Marcelo Mendonça Teixeira

                                     

Apesar dos evidentes benefícios para o processo de ensino-aprendizagem, devemos repensar a influência da internet e das novas tecnologias em nossa cultura, conscientes de seus pontos fortes e limitações,  como a falta ou a precariedade de acesso à rede.O ciberespaço, responsável pela rede global de comunicação mediada, possibilita as relações tecnos sociais atuantes na sociedade contemporânea, ampliadas por redes sociais: uma sociedade conectada, colaborativa, hipertextual, destituída de presencialidade física e apoiada por interfaces da Web 2.0, mais recente, por recursos da Web semântica e pela computação em nuvem. Outros tantos atributos são delegados ao universo virtual, assim como os problemas que dela fazem parte, como isolamento e sobrecarga cognitiva, informações duvidosas, dependência e info-exclusão de milhares de pessoas que também querem fazer parte dessa cultura global, mas que, por algum motivo, geralmente de cunho econômico, estão longe de se tornar ciberculturais e integrantes de alguma geração digital.
 

O conceito de cibercultura 

 

 

 

A ausência de significado explícito na literatura nos condiciona ao étimo da palavra “cibercultura”. Assim, em sentido estrito, temos o prefixo “ciber” (de cibernética) + “cultura” (sistema de ideias, conhecimentos, técnicas e artefatos, de padrões de comportamento e atitudes que caracteriza uma determinada sociedade). No entanto, o ambíguo conceito sofre variações a partir do referencial etimológico, pois cada autor exprime uma conotação ideológica e descritiva própria que nem sempre é compartilhada por seus pares. Desse modo, optei por aqueles que se dedicam ao estudo das práticas tecnossociais da cultura contemporânea e de suas novas formas de sociabilidade, comutadas do mundo físico para o universo virtual (Teixeira, 2012a). 
 
Pierre Lévy, ao publicar A máquina universo (1987), lapida o conceito de cibercultura ao indagar questões pertinentes ao movimento sociotecnocultural em que a sociedade está inserida. Segundo o filósofo, este é um tema polêmico e multifacetado em que culturas nacionais fundem-se a uma cultura globalizada e cibernética, envoltas no ciberespaço e orientadas por três princípios: interconexão, comunidades virtuais e inteligência coletiva. Trata-se de um “conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço” (Lévy, 2010, p. 17). As “técnicas” condicionam as interações sociais, mas não representam a cultura do ciberespaço, que se incorpora no espaço virtual-cognitivo das pessoas, na partilha de sentimentos, informações e saberes. Afinal, “a virtualização é um dos principais vetores da criação da realidade” (Lévy, 2009, p. 18). 
 
Desde o final da década de 1990, a introdução das tecnologias de informação e comunicação (TICs) na educação é aceita por sistemas de ensino em todo o mundo como uma epítome do desenvolvimento educacional na história da humanidade. Nesse sentido, os governos nacionais têm investido massivamente na compra de equipamentos, softwares e formação docente contínua, à medida que surgem recursos tecnológicos inovadores.
 
Em situação contrária, o país é rotulado como uma nação pobre e infoexcluída pelo International Bureau of Education, órgão da Organização das Nações Unidas para a Educação e a Ciência (Unesco) especializado em educação com o objetivo de facilitar a oferta de educação de qualidade em todo o mundo. Na verdade, criou-se um estigma globalizado que correlaciona o aparato tecnológico da escola, da universidade ou do centro de ensino à qualidade da educação, tornando-o sinônimo de mão de obra qualificada, mas nenhuma evidência científica lastreia o argumento de que as TICs são decisivas na aprendizagem de jovens e adultos, conforme Aviram (2000).
 
Não seriam facilitado­res? Aviram propõe que o desenvolvimento mais significativo que acompanha a revolução das TICs na educação ocorre fora da escola, refletido na impressionante quantidade de alunos que não estudam em casa nem pertencem a nenhum sistema formal de ensino (prática comum no Reino Unido). Citando o caso inglês, o autor conta que os membros da classe média acreditam que as chances para o progresso educacional de seus filhos são maiores em casa (com o auxílio de materiais didáticos e grupos de apoio baseados na internet) do que na escola. O mesmo se estende à universidade, dados os milhares de alunos matriculados em cursos de nível superior on-line. A Open University, por exemplo, tem aproximadamente 250 mil estudantes no Reino Unido, na Irlanda e na Europa (www8.open.ac.uk /about/main/).
 
O ciberespaço possibilita o autoaprendizado, facilita a interatividade e estimula a troca de informações e saberes, mas não garante o sucesso do aprendizado, comumente desmotivado pela falta de estímulo. Disso decorre a importância da escola e do professor como mediadores do conhecimento a ser construído, aliados às estratégias pedagógicas, materiais didáticos e metodologias de ensino. Ainda assim, particularidades por vezes desconhecidas, outrora ignoradas, fazem a diferença quando “lincamos” educação a cibercultura. Diante disso, Lemos (2003) indica novas possibilidades de socialização do conhecimento através de três leis da cibercultura: lei da liberação do polo da emissão, lei da conectividade e lei da reconfiguração.
 
A primeira refere-se a uma modificação no modelo de comunicação até então vigente (meio massivo unidirecional — um para todos) e cede espaço à comunicação interativo-colaborativa (meio pós-massivo multidirecional — todos para todos). A máxima é “tem de tudo na internet”, “pode-se tudo na internet”. A segunda define que a rede está em todos os lugares, generalizada, interligando tudo a todos. Mediante a crescente interconexão entre dispositivos de comunicação digital, amplia a troca de informações entre homens e homens, máquinas e homens e também entre máquinas e máquinas. A terceira é contrária à mera substituição de práticas e favorável a seu redesenho em face das novas possibilidades instrumentalizadas pelo ciberespaço, evitando a lógica da substituição ou do aniquilamento dos antigos meios, já que, em várias expressões da cibercultura, trata-se de reconfigurar práticas, modalidades midiáticas ou espaços sem a substituição de seus respectivos antecedentes (Lima, 2011; Lemos, 2003).
 

Uma educação cibercultural

 
 
 
 
Para a educação, urge que implementemos mudanças no ensino tradicional, secularmente institucionalizado, reconfigurando práticas educomunicativas de acordo com o novo cenário sociotécnico atual, frente à emergência de novas formas de comunicação interativa (muitos para muitos) e da miríade de conteúdos informativos na rede. Doravante, acompanhar a evolução midiática e fazer uso tanto dos antigos quanto dos novos recursos comunicativos é um imenso desafio, congênere às peculiaridades de cada contexto educativo (situações ambientais e transformações da consciência coletiva em rede), obviamente, em sentido figurado, tendo em vista que a alfabetização midiática não está disponível a grande parte da população mundial.
 
Aos afortunados “nativos digitais” equivale a realidade mencionada: um universo virtual que suporta o processo de criação, produção e distribuição de produtos, informações e serviços; a inteligência coletiva, o hipertexto e a inteligência artificial; as interfaces síncronas e assíncronas de comunicação; as comunidades virtuais, a colaboração em massa e a interatividade em tempo real, onde as pessoas estão conectadas e o conhecimento é compartilhado (através de imagens, vídeos, textos, áudios) em escala global (Teixeira, 2012b). A cibercultura totaliza esse contexto, símbolo de um período da história da humanidade marcado pela comunicação eletrônica e pelas mídias digitais, influenciando, direta ou indiretamente, a educação e os modos de ensinar e aprender. 
 
A cibercultura também se faz presente na educação por meio de múltiplas linguagens, múltiplos canais de comunicação e em temporalidades distintas. As interfaces da Web 2.0, por exemplo, permitem um contato permanente entre escola, professores, alunos e seus pares no ambiente virtual de ensino. Sem fronteiras para o conhecimento, os conteúdos educativos são trabalhados interativamente na comunidade estudantil, de forma síncrona e assíncrona, com a possibilidade de produzir e compartilhar conhecimentos colaborativamente com qualquer outro estudante em qualquer parte do mundo.
 
Contudo, apesar dos evidentes benefícios para o processo de ensino-aprendizagem, devemos repensar a influência da internet e das novas tecnologias em nossa cultura, conscientes de seus pontos fortes e limitações, como a falta ou a precariedade de acesso à rede. Além disso, é fundamental avaliar a capacidade do estudante para utilizar as tecnologias propostas como instrumento de produção de conhecimentos transdisciplinares, e não apenas de informação, redefinindo a racionalidade comunicativa em estratégias educacionais no ambiente virtual.
 
Em outras palavras, a abstenção não é realmente uma opção para instituições de ensino, professores e gestores educacionais, já que a introdução das TICs na educação faz parte de uma revolução sociocultural mais ampla e profunda que está mudando a cultura do mundo contemporâneo. Quem deseja sobreviver profissionalmente a essas mudanças ciberculturais não tem outra opção senão adaptar-se à época em que vivemos, marcada por novos modos de comunicação, estilos de vida, identidades, entretenimento, interatividade às novas formas de ensinar e aprender.
 
A adaptação, porém, requer uma estratégia bem definida, com base em uma clara compreensão da nova cultura emergente, dos valores explícitos e objetivos educacionais, evitando o instrucionismo mecanizado. Por isso, torna-se necessária uma literacia informática prévia entre educadores e educandos, como meio de melhorar competências, conhecimentos, atitudes e perspectivas sobre o futuro da aprendizagem, que é cada vez mais colaborativa. Os consumidores tornam-se produtores e os produtores tornam-se consumidores de conteúdos, bens e serviços, em um novo modelo econômico planetário, sem restrições ou barreiras, induzido por um processo contínuo de colaboração massiva (Tapscott e Williams, 2010).
 
Portanto, o conceito de cibercultura está em permanente transformação, com muitas conotações, idealizadas notoriamente pelas práticas tecnossociais da cultura contemporânea e de suas novas formas de sociabilidade no universo virtual, ou seja, uma virtualização cultural da realidade humana, fruto da migração do espaço físico para o virtual mediado pelas TICs e regida por códigos, signos e relações sociais dentro e fora dos espaços escolares. 

Referências


AVIRAM, A. (2000). “Computers in the classroom” to mindful radical adaptation by education systems to the emerging cyber culture. Journal of Educational Change, v. 1, n. 4, p. 331-352, dez. 2000.

LEMOS, A. Cibercultura: alguns pontos para compreender a nossa época. In: LEMOS, A.; CUNHA, P. Olhares sobre a cibercultura. Porto Alegre: Sulina, 2003. p. 11-23.

LÉVY, P. La machine univers: création, cognition et culture informatique. Paris: La Découverte, 1987. 
___. Cibercultura. São Paulo: Edi­tora 34, 2009.
___. O que é virtual? São Paulo: Editora 34, 2010.

LIMA, M. (2011). Educação na cibercultura: novas possibilidades para o ensino-apren­di­zagem. Disponível em: 

TAPSCOTT, D.; WILLIAMS, A. Wikinomics: how mass colla­boration changes everything. New York: Penguin Group, 2010.

TEIXEIRA, M. Cyberculture: from Plato to the virtual universe. The architecture of collective intelligence. Munique: Grin Verlag, 2012a.
___.  As faces da comunicação. Munique: Grin Verlag, 2012b.

  • Marcelo Mendonça Teixeira Mestre em Tecnologia Educativa, professor e consultor em tecnologias de informação aplicadas às plataformas de e-learning. marcelo.uminho.pt@gmail.com