DO COMPORTAMENTO À COGNIÇÃO: TRANSFORMAÇÕES EPISTÊMICAS NO PENSAMENTO BEHAVIORISTA DO SÉCULO XX
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O surgimento de teorias cognitivistas no
âmbito do pensamento behaviorista do século XX
1. Introdução
O behaviorismo refere-se a um conjunto de teorias e técnicas voltado à
explicação e intervenção sobre o comportamento humano. Em linhas gerais, esta
corrente de pensamento afirma que o comportamento consiste em respostas a estímulos
ambientais, aprendidas ao longo do desenvolvimento dos indivíduos. O behaviorismo
tem sua formulação inicial com os estudos de Ivan Pavlov e John Watson. A partir de
experimentos realizados com animais, o primeiro autor dedicou-se a descrever a apresentação de comportamentos reflexos por sujeitos de pesquisa, adquiridos mediante
a associação entre estímulos condicionados e não-condicionados (PAVLOV, 2003).
Por sua vez, no início do século XX, Watson aplica resultados da pesquisa de
Pavlov ao estudo do comportamento humano. Em seus trabalhos, ele demonstra que
determinadas respostas, tais como o medo, podem ser aprendidas por semelhante
associação entre estímulos neutros e estímulos que naturalmente suscitam a reação
emocional em questão (WATSON; RAYNER, 1920).
(...) Segundo o autor, apenas o comportamento diretamente observável configura objeto do
saber científico. A Psicologia científica deve, portanto, abandonar a pretensão de
investigar fenômenos internos aos indivíduos.
Esta premissa é assumida por F. B. Skinner, o qual, a partir da década de 1930
ampliará o arcabouço teórico behaviorista. Aos estudos de Pavlov e Watson, Skinner
acrescenta, entre outras contribuições, a noção de condicionamento operante. Conforme
esta noção, comportamentos são aprendidos não apenas pela associação de estímulos,
mas também em razão das consequências que produzem (SKINNER, 1970). Ou seja, na
medida em que um comportamento leva a consequências reforçadoras para o sujeito, ele
tenderá a se repetir, assim como um comportamento que conduz a consequências não reforçadoras tenderá a se extinguir (SKINNER, 1970).
(...)
2. O surgimento do Behaviorismo com John Watson e Ivan Pavlov
(...)
A Psicologia
havia se constituído como disciplina científica autônoma, no final do século XIX, mais
precisamente em 1879. Desde então, seu principal objeto de pesquisa era a consciência
humana e seu principal método, a introspecção (WEITEN, 2016).
Porém, como Watson afirma, a consciência é intangível, ela não pode ser vista,
sentida, medida. Para produzirmos um conhecimento científico, devemos ter como
objeto de estudo fenômenos que são diretamente observáveis (WATSON, 1913). Logo,
a Psicologia deverá se dedicar apenas ao estudo do comportamento humano e de outros
animais. E, por conseguinte, seu método não deve ser mais a introspecção, e sim
técnicas para medir este comportamento (WATSON, 1913).
É importante ressaltar que Watson, tal como outros behavioristas que surgirão
posteriormente, não negava a existência da consciência. O que Watson estabelecia era a
impossibilidade de se estudá-la cientificamente. Desta maneira, além de se restringir ao
comportamento, o behaviorismo deveria explicá-lo considerando apenas a influência de
fatores ambientais e não fatores internos ao sujeito (como impulsos, desejos, fantasias).
Conforme Schneider e Morris (1987, p. 31), o behaviorismo watsoniano recebeu
distintas designações ao longo de seu desenvolvimento, sendo que “behaviorismo
extremo é o termo que mais frequentemente encontramos como designação da
psicologia de Watson”. Porém, como ressalta Lashley (apud STRAPASSON;
CARRARA, 2008), os estudos iniciais deste psicólogo habilitam-nos a denominar seu
pensamento também pelo termo Behaviorismo Metodológico.
O Behaviorismo Metodológico assume como premissa epistemológica e
ontológica que “fatos da consciência existem, mas não servem a nenhuma fonte de
tratamento científico” (LASHLEY apud STRAPASSON; CARRARA, 2008, p. 2). Em
outras palavras, se por um lado Watson reconhece a existência de fenômenos mentais,
por outro a ciência psicológica deve renunciar a estudá-los, caso contrário, incorreria no campo da metafísica. Assim sendo, “a natureza dos eventos psicológicos não é passível
de investigação científica” (STRAPASSON; CARRARA, 2008, p. 2).
Watson considerava o comportamento como sendo uma resposta de determinado
organismo (humano ou não) a estímulos ambientais. Em decorrência, a tarefa central do
behaviorismo tornou-se compreender como ocorre a formação destas respostas
(WATSON, 1913). Ou seja, como ocorre a aprendizagem. Para o estudo da
aprendizagem, Watson baseou-se nas pesquisas desenvolvidas pelo cientista russo Ivan
Pavlov.
Pavlov foi um fisiologista russo que se dedicou, entre outros temas, ao estudo da digestão. Ao realizar experimentos sobre a salivação em cães, este cientista identificou um fenômeno bastante peculiar. Em seus experimentos, Pavlov apresentava comida a cães e media a salivação dos animais diante do alimento. Todavia, ele percebeu que aqueles cães que já estavam acostumados com o experimento, salivavam antes da chegada da comida, apenas por ouvirem o barulho do dispositivo mecânico que fornecia o alimento (PAVLOV, 2003).
O cientista decidiu então estudar este fenômeno específico. Como resultado, ele constatou que: um estímulo neutro (como o som de uma máquina), pode produzir respostas (como a salivação do cão), caso este estímulo seja associado a um segundo estímulo que naturalmente produz a resposta (no caso a carne, que naturalmente faz os cães salivarem) (PAVLOV, 2003). Em outras palavras, pela associação do barulho de uma máquina com um alimento fornecido, os cães passavam a salivar meramente por ouvirem este barulho. Eles emitiam, assim, o que hoje se chama de resposta condicionada.
Watson buscou aplicar a descoberta de Pavlov ao estudo do comportamento
humano. O psicólogo realizou experimentos com um bebê de 11 meses, identificado
pelo nome de Albert B. Nestes experimentos, o bebê era colocado para brincar com um
camundongo. O pesquisador emitia então um ruído estridente, sempre que Albert tocava
o animal, provocando no bebê reações de medo e choro (WATSON; RAYNER, 1920).
Após o pareamento destes dois estímulos por diversas vezes, Albert passou a
emitir reações de medo, choro e estresse meramente diante do camundongo. Além disto,
tal resposta condicionada também foi generalizada para outros estímulos, que mantinha
alguma semelhança com o camundongo, tais como animais peludos (como coelhos e
cães), objetos felpudos, como casacos ou mesmo uma máscara de Papai Noel
(WATSON; RAYNER, 1920).
"Neste vídeo, mostramos trechos do original experimento de Watson com a criação de uma resposta condicionada (medo) através de um estímulo neutro. Embora polêmico pela utilização de um bebê, foi de grande avanço no estudo do comportamento humano na época."
Watson publicou os resultados deste experimento no ano de 1920, procurando demonstrar que a aprendizagem descrita por Pavlov ocorre em humanos. Esta aprendizagem é chamada hoje de condicionamento clássico. O condicionamento clássico apresenta algumas características que cumpre sintetizarmos aqui.
Uma primeira característica é que sua aquisição depende, como visto, da
contiguidade dos estímulos, isto é, eles serem apresentados juntos no tempo e no
espaço. Quanto maior a contiguidade, mais forte será o condicionamento (MALOTT,
2008). Em segundo lugar, uma resposta condicionada pode ser extinta. A extinção desta
resposta depende do enfraquecimento da contiguidade (MALOTT, 2008). Por exemplo,
quanto mais o camundongo for apresentado a Albert sem o ruído, menos ele provocará
reações de medo.
Há, no entanto, uma terceira característica do condicionamento clássico. Ela se
refere ao fato de que uma resposta condicionada que foi extinta, pode ser recuperada
espontaneamente (MALOTT, 2008). Pavlov observou que mesmo após extinguir a
resposta de salivação de seus cães, em alguns cães esta resposta reaparecia em ocasiões
futuras. Ou seja, os cães voltavam a salivar.
Em quarto lugar, como mostra o experimento de Albert, as respostas
condicionadas podem ser generalizadas (MALOTT, 2008). Isto significa que um
organismo, que aprendeu a responder a estímulos específicos (como o camundongo), é
capaz de responder igualmente a estímulos semelhantes ao original (o coelho, a roupa, a
máscara). Em contrapartida, pode também ocorrer no condicionamento clássico um
fenômeno inverso. Trata-se da discriminação do estímulo. Ela implica que as respostas
condicionadas só serão emitidas diante de estímulos idênticos ao original (MALOTT,
2008)
"O condicionamento clássico (ou condicionamento pavloviano ou condicionamento respondente) é um processo que descreve a génese e a modificação de alguns comportamentos com base nos efeitos do binómio estímulo-resposta sobre o sistema nervoso central dos seres vivos. O termo condicionamento clássico encontra-se historicamente vinculado à "psicologia da aprendizagem" ou ao "comportamentalismo" (Behaviorismo) de John B. Watson, Ivan Pavlov e Burrhus Frederic Skinner."
3. B. F. Skinner e o condicionamento operante
(...) A teoria elaborada por ele ficará conhecida como Behaviorismo Radical.
Como afirmam Schneider e Morris (1987), este termo foi utilizado pelo próprio Skinner, em 1945, para designar seus estudos. O Behaviorismo Radical sustenta que todos os fenômenos animais (humanos ou não) consistem em processos físicos, entidades naturais, e que, portanto, devem ser estudados segundo os mesmos métodos e princípios que regem as ciências da natureza. Entre as principais contribuições de Skinner para o estudo do comportamento, está o conceito de comportamento operante (SKINNER, 1970).
Enquanto o condicionamento clássico refere-se a comportamentos reflexos, que estão fora do controle do indivíduo (como salivar ou ter reações fisiológicas de estresse), o condicionamento operante refere-se a comportamentos voluntários, controláveis pelo indivíduo (como atos de estudar, trabalhar, relacionar-se com outras pessoas) (SKINNER, 1970).
Para Skinner, estes comportamentos voluntários foram aprendidos, com base em estímulos consequentes, isto é, com base nas consequências que provocam. Assim, o princípio fundamental do condicionamento operante estabelece que: as ações que produzem consequências reforçadoras tendem a se repetir, e aquelas que não produzem tais consequências, tendem a se extinguir (SKINNER, 1970).
Consequências reforçadoras podem ser de caráter tanto positivo quanto negativo.
(...) De tal maneira, segundo Skinner (1970), um comportamento aumentará ou
diminuirá em frequência, conforme as consequências que ele produz (SKINNER, 1970).
Por exemplo, os indivíduos estão mais propensos a consumir uma droga ou outra
substância, quando esta provoca efeitos prazerosos (reforço positivo) ou aliviam
sensações desagradáveis (reforço negativo). Em contrapartida, os indivíduos estão
menos propensos a usarem uma droga ou outra substância, quando esta provoca consequências desagradáveis (punição).
Para Skinner, comportamentos aprendidos por condicionamento operante estão
presentes nas mais diversas circunstâncias de nossas vidas, tais como nossos
comportamentos na família, na escola, nas relações conjugais e de amizade, no trabalho,
em relação às religiões, entre outros. O condicionamento operante possui características
que cumpre apresentarmos.
(...) Modelagem:
Ela é necessária quando um organismo não emite, de
imediato, a resposta a ser reforçada. Com isto, pela modelagem, reforçam-se os
comportamentos que vão sucessivamente se aproximando desta resposta. Por exemplo,
se é esperado que um indivíduo cesse o consumo de drogas e ele ainda não é capaz de
fazê-lo no momento, devemos então reforçar comportamentos aproximados, como a
redução progressiva do consumo.
(...) Esquemas de reforço:
(...) Podem ser usados para se condicionar um comportamento.
(...) Extinção dos comportamentos aprendidos
por condicionamento operante.
Esta extinção ocorre tanto pela punição, quanto pelo
reforço de comportamentos alternativos (CHIESA, 1994).
(...)
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DO COMPORTAMENTO À COGNIÇÃO: TRANSFORMAÇÕES
EPISTÊMICAS NO PENSAMENTO BEHAVIORISTA DO SÉCULO XX
FROM BEHAVIOR TO COGNITION: EPISTEMIC TRANSFORMATIONS IN TWENTIETHCENTURY BEHAVIORIST THINKING
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